terça-feira, 30 de março de 2010

Fumo negro

Em dias cinzentos a música parece sempre errada. Como se vez após vez após vez colocássemos o disco errado. O efeito verdadeiramente incrível está no facto de que depois não conseguimos deixar de ouvir a música até ao fim. Que nos leva a ficar sob este feitiço? Esta estranha forma de masoquismo que é subjugar a nossa vontade ao rumo que ela parece tomar por si só. A questão aqui é que secretamente o nosso intímo está a dizer-nos algo. Os dias cinzentos não vão deixar de o ser só porque queremos. Temos de lhe dar o que ele deseja. E perceber que as suas faltas são as nossas faltas.

Hoje o meu dia foi cinzento. Ao som da mesma música repetida sem fim na minha cabeça. E não era a música certa.

E saber que um olhar assim seria remédio para tantos males da alma...


Diane Kruger, retirada do E Deus criou a Mulher.

domingo, 21 de março de 2010

dia da poesia

Uma vez que este Domingo foi dia da poesia. O meu poema favorito de Fernando Pessoa, tributo ao meu amado Tejo, eterno confidente.



"Tu, de quem o sol é sombra,
De quem cadáver o mundo,
Meus passos guia, aqui na sombra
O sentir-te, ermo e profundo

Presença anónima e ausente
De quem a alma é o véu
A meus passos de um consciente
Tão consciente que é teu

Para que, passadas eras
De tempo ou alma ou razão
Meus sonhos sejam esferas
Meu pensamento, visão

Bem sei que todas as mágoas
São como as mágoas que são
Parecidas com as águas
Que continuamente vão

Quero pois ter guardada
Uma tristeza de mim
Que não possa ser levada
Por essas águas sem fim

Quero uma tristeza minha
Uma mágoa que me seja
Uma espécie de rainha
Cujo trono se não veja

A madrugada irreal do quinto império doira as margens do Tejo..."